Um governo “lame duck” - Hélio Duque*








  









                      Em 1974, o escândalo Watergate (escuta ilegal na sede do oposicionista Partido Democrata,em Washington) levou o presidente dos EUA, Richard Nixon a renunciar. O seu vice, Spiro Agnew, já havia sido afastado por envolvimento com a corrupção. Constitucionalmente coube ao deputado Gerald Ford, presidente da Câmara, assumir a Casa Branca, na titularidade e pleno exercício do poder. A sua administração de dois anos foi marcada por incompetência e tempos tempestuosos. Foi quando o jornal “New York Times” reabilitou expressão popular em desuso há muitos anos, na realidade política e administrativa dos norte-americanos: “Lame Duck”. O presidente Ford seria um “pato manco”, à frente de um governo impotente e ineficaz.
                        Os brasileiros poderão conhecer, nos próximos tempos, o que seria um governo “pato manco”. A governabilidade de Dilma Rousseff e seu mastrodômico ministério e agregados, apontam um cenário de aprofundamento de crises recorrentes nas áreas econômicas, políticas e sociais. A escalada de problemas que aflorarão se expressarão no descontentamento e manifestações ancoradas em grandes parcelas da opinião pública indignadas com a perda de poder aquisitivo, em consequência do desemprego, de um lado e do outro, de uma inflação corrosiva da renda. Além de taxas de juros extravagantes, com reflexo direto no bolso dos brasileiros. A escalada de problemas com implicações econômicas geradas pelo governo Dilma I, com a sua fantasiosa “nova matriz econômica” (a verdadeira herança maldita) será colhida pelo governo Dilma II.
                        A corrupção, onde a Lava Jato escancarou uma realidade que é sistêmica, disseminada em outros setores, travarão o imperativo crescimento econômico. Bastando citar: somente a Petrobrás, responsável por 13% do PIB, terá brutal redução nos seus programas de investimento. Afetando diretamente a economia brasileira. A contração dos investimentos se refletirá, por consequência, nos próximos anos em taxas minguantes de crescimento. A vítima será o mercado de trabalho com desemprego crescente, menor aumento do salário real e redução do consumo das famílias.
                        O enfrentamento dessa brutal realidade seria possível com uma política econômica austera recuperadora da credibilidade perdida. E em sendo exituosa não oferecerá resposta de curto prazo. Os seus efeitos tem um prazo mais longo. Um governo que acredita na fantasia e nas “verdades” de marqueteiro apoiará o que precisa ser feito em política econômica? Ou, um governo que fez tudo errado buscando no populismo a âncora da popularidade, nos 45 meses que lhe resta, fará autocrítica e adotará idéias e princípios econômicos responsáveis? Ou, será que o marqueteiro João Santana já está preparando material propagandístico para responsabilizar o ministro Joaquim Levy, como o “bode expiatório” da desaprovação do governo Dilma Rousseff?
                        Pelo lado político, a situação é dramática. O executivo perdeu a agenda e o controle da Câmara e Senado, de maneira inédita na vida republicana, mesmo tendo uma base parlamentar com maioria nominal. Começando pelo PMDB que tem o vice-presidente da República. Camaleônico e oportunista é capaz de tudo, inclusive tirando o corpo fora se a crise de governabilidade se agravar. Não é um parceiro solidário para os desafios e dificuldades que o futuro aponta: a recessão econômica que é inexorável e será presente nos anos próximos. Estará pronto para responsabilizar o poder executivo como único responsável pelo desastre. A sua índole é a de escorpião. Mesmo tendo sido partícipe ativo e patrimonialista poderoso nos últimos anos.
                        Paralelamente, o Brasil está entrando em um nível de descontentamento agressivo envolvendo atores políticos, econômicos e sociais. Situação explosiva e perigosa pela dimensão que pode atingir nos meses entrantes. O binarismo primário alimentado nos últimos doze anos baniu o debate de ideias. Em seu lugar fecundou de maneira rudimentar a divisão da sociedade. Nos anos de euforia lulista era o “nós” contra “eles”. Quem não  se alinhava com o governo eram “neoliberais”, “entreguistas”, “inimigos dos pobres”. Lançou as bases para a degradação do debate político nacional.
                        Realidade traduzida com precisão cirúrgica, pelo professor Milton Lahuerta, coordenador do Laboratório de Política e Governo da Universidade Estadual Paulista: “Em grande parte isso se deve ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que incentivou essa polarização do se apresentar como aquele que estava inaugurando uma nova era, uma transformação social que, em quatro séculos não havia ocorrido. Como se fosse possível reduzir toda a luta pela democracia no País a um personagem e a um partido político. Agora estamos vivendo algo muito grave.” 
          Os tempos tempestuosos em que o Brasil mergulhará serão de grave recessão econômica, crise política com amplitude inédita e desajustes sociais, penalizador da sociedade. É reflexo da ilusão, mentira, incompetência e corrupção, geradas nos últimos doze anos. Venderam o paraíso e agora estão mandando os brasileiros para o inferno.



Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira.


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