Aécio e a refalsada social democracia
O notável escritor Leon Tolstoy ensinava: “Canta a tua aldeia e
serás universal”. O senador Aécio Neves, presidente nacional do PSDB, anuncia
que comandará nos próximos meses uma atualização do programa partidário da
agremiação. Na convenção nacional marcada para maio de 2015, o novo programa
partidário incorporaria abertura com temas alicerçadas nos princípios da social
democracia. Defenderá um partido renovado, mobilizador da sociedade com a
filiação de militantes e estruturando a participação de segmentos distanciados
da sigla, sobremaneira a juventude. Pretenderia formular novo programa
partidário sintonizado com a sociedade contemporânea.
É ilusão imaginar que a votação que obteve tenha nascido da organização
partidária. Foi o anti-PT que mobilizou os brasileiros a marcharem na ampla
frente que lhe conferiu os milhões de votos. Observe que foi por um triz que o PSDB
não se transformou em um partido médio na Câmara, ao eleger 54 deputados
federais. Comprovando que é importantíssimo recriar a organização partidária,
adotando estratégia organizacional que preencheria o vácuo de no Brasil não
existir um partido social democrata, de fato.
A
angústia shakesperiana do “To be or not to be” (ser ou não ser) é vivida no
cotidiano por um partido que deveria ser social democrata. Não basta apenas lançar,
como pretende, campanha maciça de filiação de novos quadros. É oportuníssima a
observação do professor Renato Janine Ribeiro, da USP: “O PSDB não cria
capilaridade, não se articula na área sindical, não ouve, não vai buscar
cientistas, os intelectuais, não senta para ouvir. Temos um problema com o
principal partido de oposição, que não cria laços com a sociedade.”
Na
maioria dos Estados, tem presença errática, sendo uma legenda a mais na
constelação dos partidos médios e pequenos. Destacadamente no Rio Grande do
Sul, Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia, Santa Catarina, dentre outros. Colégios
com grande expressão eleitoral. No nordeste inexiste. Mesmo no Ceará, a eleição
do senador Tasso Jereissati, deveu-se a méritos próprios, advindo das suas
excelentes administrações à frente do Estado. E não por existir estrutura
partidária. Mesmo em Estados onde governa, a sua fragilidade é real. No Paraná,
por exemplo, reelegeu o governador, mas teve somente oito candidatos a deputado
federal, elegendo três representantes. Nas eleições municipais de 2012, não
elegeu prefeito em nenhum município importante com densidade de votos.
Contentou-se com os pequenos municípios.
Nas
terras paranaenses, o PSDB vive uma realidade paradoxal e surrealista: o
senador Alvaro Dias, reeleito com 77% dos votos paranaenses não tem no
diretório regional ou nos municipais, nenhum representante. Certamente, o
padrão de excluir lideranças com prestigio popular, deve se repetir em outras
regiões. Caracterizando, em algumas delas, ser um partido de capitanias hereditárias.
Onde a direção partidária regional sepulta o viver democrático, marginalizando
o diálogo, fazendo prevalecer a vontade de “supostos donos” da legenda. É a
negação da democracia interna que deve prevalecer nos núcleos políticos
compromissados com a liberdade.
Na
presidência do PSDB, Aécio Neves não deveria admitir a existência dessa
realidade excludente. Não basta, portanto, filiar militantes, é fundamental reorganizar
política e doutrinariamente o seu partido. Sepultando os projetos pessoais
dissimuladores, grande responsável pelo seu raio limitado de expansão. É
essencial fazer do diálogo, com encontros e desencontros, o fundamento dos
debates internos, onde a liberdade de convergir e divergir sejam princípios
inegociáveis. Arrumando a casa nos princípios social democrata, terá autoridade
para mobilizar a sociedade no amplo debate nacional e explicitador do seu
projeto de País. A rigor, a irrelevância dos partidos políticos brasileiros, se
origina na inexistência de doutrina e programas articulados com as aspirações
da sociedade. Foram transformados em “armazéns de secos e molhados”, onde
ofertam aos governos de plantão a mercadoria desejada: voto e apoio. Daí se
origina a corrupção patenteada pelo “mensalão” e agora pelo “petrolão”.
O
PSDB, nas eleições de 2014, obteve próximo de 2 milhões de votos na legenda,
numa clara demonstração de potencialidade de crescimento na sociedade. A grande
missão do seu presidente nacional seria reconectar a legenda com as aspirações
de enormes parcelas de brasileiros que acreditam em um projeto político autenticamente
republicano.
Por
fim, o estimado amigo Almir Pazzianotto Pinto, ex-ministro do Trabalho, nomeado
por Tancredo Neves, faz oportuna advertência: “O PSDB sempre foi reticente em
atitudes e raquítico em militantes voluntários. Caracteriza como partido
desacostumado ao contato permanente com as massas. Sem elas, entretanto, jamais
terá chances de vencer.”
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela
Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É
autor de vários livros sobre a economia brasileira.
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